quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Crítica: Réquiem Para um Sonho (2000)













“I'm somebody now, Harry. Everybody likes me. Soon, millions of people will see me and they'll all like me. I'll tell them about you, and your father, how good he was to us. Remember? It's a reason to get up in the morning. It's a reason to lose weight, to fit in the red dress. It's a reason to smile. It makes tomorrow all right. What have I got Harry, hm? Why should I even make the bed, or wash the dishes? I do them, but why should I? I'm alone. Your father's gone, you're gone. I got no one to care for. What have I got, Harry? I'm lonely. I'm old.”

Título original: Requiem for a Dream. Dirigido por: Darren Aronofsky. Produzido por: Eric Watson, Palmer West. Roteiro de: Darren Aronofsky, Hubert Selby Jr. Montado por: Jay Rabinowitz. Fotografia de: Matthey Libatique. Estrelando: Ellen Burstyn, Jared Leto, Jennifer Connelly, Marlon Wayans.

Parte 1: O sonho

Assistir Réquiem para um Sonho é levar um soco no estômago, tamanho é o desgaste emocional que o filme traz. É como se você fosse pisoteado por uma manada faminta. Quer o espectador goste ou não do filme, ele deixa um marco no inconsciente, retratando o uso de drogas (legais ou ilegais) de maneira clara, entregando tudo explicitamente. A película acerta ao trazer não o mundo underground, dos becos e bueiros, mas um mundo que poderia ser o de qualquer um.


A trama acompanha a jornada de quatro personagens. A primeira é Sara Goldfarb (Ellen Burstyn) , uma viúva que fica em êxtase ao ser convidada para participar de um programa de televisão. Ao receber o convite, ela fica obcecada por melhorar sua aparência. Dessa forma, para perder peso e caber em seu vestido preferido, ela começa a usar anfetaminas durante o dia em conjunto com sedativos à noite. Seu filho Harry (Jared Leto), viciado em heroína (palavra que não é citada uma única vez em toda a película), tem a “brilhante” ideia de revender drogas alterando sua qualidade junto com sua namorada Marion (Jennifer Connelly), que sonha em ser estilista, e seu melhor amigo Tyrone (Marlon Wayans).

Qual será o diferencial desse filme tão cultuado? Várias produções já discutiram essa temática, mas nenhum filme alcançou tal sucesso. Atribuo a perfeição atingida, que alçou Darren Aronofsky a outro patamar como cineasta, à trinca: montagem, roteiro e trilha.

O roteiro acerta ao apostar em poucos personagens, desenvolvendo-os ao máximo. Dentre os recursos narrativos que saltam aos olhos, figura a chamada hip hop montage ou fast cutting, que consiste em justapor planos curtíssimos com cortes frenéticos, no ritmo do pensamento dos personagens e do espectador. A técnica deriva da cultura do hip hop dos anos 90 e dos jump cuts da Nouvelle Vague francesa. O recurso funciona bem, pois é utilizado com fluidez e sem exageros, encaixando-se perfeitamente aos personagens e seus universos.


Não há como escrever sobre este filme sem citar a trilha sonora composta com maestria por Clint Mansell. Foi para esta película que foi criada a famosíssima música instrumental Lux Aeterna, que por si se tornou um clássico, um ícone. Ela é utilizada exaustivamente em trailers, games, publicidade e até em trabalhos escolares.

Ellen Burstyn, hoje com 80 anos, apresentou neste longa, certamente, a melhor atuação da sua carreira. Ela consegue ser ao mesmo tempo extremamente cativante e chocante. Ela representou plenamente a degradação física, psicológica e humana de sua personagem. É impossível não torcer por ela com cada célula de nossos corpos, é impossível não se sensibilizar e ficar se perguntando ininterruptamente: “Como essa mulher foi capaz de chegar a esse ponto?”. O espectador fica absurdamente inquieto. Ele envolve-se e identifica-se completamente.

E é dessa forma visceral que vê-se discutida a questão do papel do sonho na vida do ser humano. O sonho é o alimento dos personagens, é o que os mantém vivos, mesmo quando tudo está perdido. A busca por seus devaneios é o estado comum dos personagens, é o que os une. Imerso nesse contexto que está o uso de drogas fomentado pela solidão e pela concorrência voraz do mundo contemporâneo.


Parte 2: O réquiem

A palavra réquiem vem do latim, significa repouso, descanso. Em liturgia cristã, essa palavra representa a música encomendada para um falecido ou uma missa ou orações fúnebres. Réquiem. Réquiem para um sonho.

O diretor brinca com imagens para compor o drama dos personagens. Ele ambiciona posicionar o espectador diante do caos e da degradação de maneira plena. Não é um filme sobre drogas, sobre drogados ou sobre vícios. É um filme sobre seres humanos e as perdas que as drogas trazem. Pode ser um braço, a liberdade, o corpo, a consciência... Não é o tipo de droga que vai determinar a degradação. Mas é o desrespeito aos próprios limites e a própria sociedade, a grande distribuidora e divulgadora das verdadeiras drogas. As imagens desse longa não são facilmente aceitáveis, demora-se um tempo para digeri-las.


O roteiro se posiciona contra o efeito devastador das drogas, mas toma o cuidado de não julgar a validade da motivação das personagens. A falta de amparo deles, simbolicamente mostrada com a posição fetal que todos adotam em algum momento, perturba e desconforta o espectador.

Os quarenta últimos minutos são os mais assustadores, principalmente pela ausência de um deus ex machina. Assim, as pessoas solitárias que embarcaram nesse verdadeiro inferno estão irremediavelmente perdidas, e o cineasta é extremamente corajoso ao acompanhar suas trajetórias até o fim. Ele termina o que começou.

Além dos diálogos emocionantes, alguns recursos estilísticos fazem-se presentes de maneira incrível. Destaque para a tela dividida no primeiro ato, útil ao salientar que, apesar da proximidade física, Harry e Sara estão distantes, pois suas perspectivas e seus sonhos divergem. Aliado a isso, encontra-se o uso de lentes que deformam as extremidades da imagem, deixando-as arredondadas. Tal recurso evidencia as características do universo das personagens, um universo turvo.

Um drama realmente intenso é revelado em cada frame dessa obra, com pessoas que passam a sentir prazer mesmo quando ele vem acompanhado de dor. Essa produção se propõe a ser um retrato da nossa sociedade, e assim deve ser encarada. O que se vê é o desvirtuamento de valores, cenas intensas, e sonhos elevados por réquiens. Otimismos e pessimismos à parte, permita-se mergulhar no que o cinema pode proporcionar. Pense na sua própria existência. Amplie-se.


Por Bernardo Argollo

P.S.: Clique nos frames para ampliá-los.

All the frames used here belong to Blu-ray.com and Lionsgate.

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